Entenda como funciona o IBS/ IVA, futuro imposto que unificará os tributos…
“Quando os ventos de mudança sopram, umas pessoas levantam barreiras, outras constroem moinhos de vento.”
Érico Veríssimo
Ao final deste post você saberá os principais objetivos da Reforma Tributária e as mudanças previstas nos projetos de emenda à Constituição Federal, quais os tributos serão extintos, como funcionará o IBS/ IVA no Brasil e como ele é utilizado no mundo.
REFORMA TRIBUTÁRIA
A Reforma Tributária tramita no Congresso desde 2003, quando o presidente do país enviou uma proposta de Emenda à Constituição sob nº: 41/03. Essa proposta complexa vem sofrendo modificações, mudanças de entendimentos, aperfeiçoamento, atualizações e muitas vezes deixado de lado desde então.
Deste modo, o IBS compartilhará o mesmo propósito e características gerais com seus similares estrangeiros a exemplo do inglês Value Added Tax (VAT), do canadense Goods and Services Tax (GST), do argentino Impuesto al Valor Agregado (IVA) ou do português Imposto sobre Valor Adicionado (IVA).
O IBS (conhecido como “IVA Brasileiro”) então trata-se de um imposto de caráter geral e indireto sobre consumo, que pretende tributar toda a cadeia econômica de produção e distribuição de bens e serviços, e que permite, a cada etapa, a dedução do imposto pago, semelhante ao ICMS. Ao final, o imposto também deve incidir sobre o “destino”, onde se verifica o consumo, recaindo sobre o consumidor final dos bens e serviços.
Antes de avançarmos no tema é necessário que você compreenda a diferença entre os seguintes conceitos:
► Tributo: são as diversas formas de arrecadação do estado e abrange: Impostos, taxas, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório e contribuições especiais.
► Impostos: são uma das modalidades de tributo, por exemplo: Imposto de Renda, IPVA, IPTU, IPI, ICMS, ISS etc.
Visto isso, voltamos ao tema.
IMPOSTO SOBRE VALOR AGREGADO – IVA
Por outro lado, do ponto de vista do contribuinte, a expectativa é que o IVA aumente a previsibilidade de cálculo do tributo, evitar a sonegação e equívocos na arrecadação fazendo gerar efeitos macroeconômicos positivos na produtividade, no consumo e no nível de emprego.
Facilitar a arrecadação e unificar os impostos é uma medida necessária para o desenvolvimento das empresas e do país.
Objetivos Específicos do IVA
1º Promover isonomia e uniformidade na tributação do consumo (eliminando desentendimento entre setores da economia);
2º Ampliar a base de cobrança com unificação de tributos;
3º Eliminar a cumulatividade de cobrança nas etapas da cadeia produtiva (impedindo o indesejado efeito cascata).
PRINCIPAIS CRÍTICAS AO IVA?
Assim como em toda mudança, os desconfortos e críticas são grandes, neste caso, bem complexas. Mas vou sitar algumas que entendo serem as principais:
Obviamente que existem vários outros temas a serem abordados, mas listei os mais comuns.
Ajustar um consenso entre tributaristas, empresários e autoridades seja algo desafiador e muito difícil, na prática, a discussão avançou bastante, e o governo quer colocá-la à prova no Congresso Nacional, com o avanço de tramitação da PEC 45/2019, na Câmara, e da PEC 110/2019, no Senado.
Em comum, as duas propostas criam um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) com tributação no destino, regras homogêneas, recuperação de crédito e mesma base de incidência abrangendo bens e serviços, exploração de bens e direitos, tangíveis e intangíveis, e locação de bens. Desde 2019, as propostas aproximaram-se. Ambas preservam, no entanto, diferenças originais significativas.
Vamos ver agora, de forma bem suscinta, os Projetos de Emenda à Constituição acima mencionados.
O IBS NA PEC 45/2019
A PEC 45/2019 foi apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e redigida em boa parte redigida pelo economista Bernard Appy, atual secretário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda. Nesta proposta, a instituição do IBS, o IVA nacional, substitui um conjunto de cinco tributos atualmente vigentes: IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS.
O IBS/ IVA nacional mantém-se único para o contribuinte, mas permite a cada ente federativo fixar uma parcela da alíquota total, pela via de lei ordinária federal, estadual ou municipal. A tributação, assim, poderá variar no território nacional. O modelo não autoriza, no entanto, alíquota diferente por produto, serviço ou setor, justamente para deixar a tributação mais objetiva.
Mas qual a diferença entre lei complementar e lei ordinária, dr. Rafael Aires? A resposta é simples: basicamente a lei complementar exige maior rigor para ser aprovada, já a lei ordinária é mais “simples.”
No que se diz à partilha dos recursos, a proposta estabelece que a União, Estados, DF e Municípios têm direito a parte da arrecadação prevista pela “sub-alíquota”. O valor total dessa “sub-alíquota” contém uma parcela com destinação constitucional pré-estabelecida (por exemplo de saúde, educação ou demais fundos), e uma parcela desvinculada.
Diante de tanta complexidade, é importante informar que a implantação completa do IBS não será imediata. A PEC 45/2019 estabelece um período de transição, tanto para a cobrança, como para a repartição da arrecadação. Isso também dará tempo para que as pessoas físicas e jurídicas possam conhecer e entender melhor o novo tributo.
Obviamente que aos poucos haverá a extinção dos tributos que conhecemos hoje até a vigência total do IBS ao longo de 10 anos. Já a conclusão da partilha de recursos entre União, estados e municípios terá prazo total de 50 anos.
Um ponto muito debatido no projeto é a proibição de concessão de benefícios fiscais. Para os defensores da PEC, a proibição elimina o risco de tratamento diferenciado. A seletividade alimenta a “guerra fiscal” que distorce o atual sistema. A proposta, no entanto, permite a devolução do IBS para contribuintes de baixa renda.
OUTRA PEC 110/2019 PARA O IBS?
Existe também outra PEC 110/2019, de autoria do senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e outros senadores, a qual repete originalmente uma proposta do então deputado Luiz Carlos Hauly apresentada há muitos anos. Nesta PEC, o IBS, equivalente ao IVA, deveria substituir somente nove tributos: IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS e ISS.
Outra diferença desta PEC é que ela cria um IBS de alíquota padrão com aplicação uniforme em todo o território nacional. Permitindo alíquotas diferenciadas para certos bens, serviços ou setores econômicos, desde que também aplicadas uniformemente no território. A determinação dessas alíquotas dependerá de lei complementar.
Quanto à partilha dos recursos, a PEC 110/2019 prevê que a arrecadação do imposto será definida constitucionalmente a partir da receita bruta do IBS, com o repasse de quota-parte para cada ente. Percentuais específicos definem a entrega direta de recursos ou estabelecem um piso mínimo de gastos para o ente federativo (destinado a saúde ou educação, por exemplo).
Nesta PEC 110/2019, a regra de transição é mais célere. São cinco anos para a redução de alíquotas e a extinção de tributos antigos, simultâneas ao aumento de alíquota do IBS e a total implantação do imposto equivalente ao IVA. Quanto a partilha partilha dos valores do IBS começa após a efetivação do novo imposto, e dura mais dez anos. A parcela de receita depende do tamanho da participação do ente federativo na arrecadação.
Ao contrário da PEC 45/2019, a PEC 110/2019 autoriza a concessão de benefícios fiscais no IBS, porém, em algumas operações especiais. Podemos citar como exemplo, benefícios para educação infantil, fundamental, médio e superior, alimentos, medicamentos, transporte público urbano, saneamento básico, além de cursos de especialização. Também é possível a devolução do imposto para o cidadão de baixa renda.
Como evoluiu a discussão das propostas?
A discussão no Congresso Nacional alterou e aproximou as duas PECs. Um exemplo está no relatório final da Comissão Mista da Reforma Tributária, apresentado em maio de 2021. O documento estabeleceu um detalhado comparativo entre as propostas e elencou sugestões de aperfeiçoamento técnico.
Em março de 2022, um substitutivo alterou a formulação original da PEC 110/2019, incorporando à proposta uma ideia também contida no PL 3.887/2020, discutido à época do governo anterior. Trata-se da implementação de um IBS, ou IVA, de modelo dual, com a extinção de apenas cinco tributos (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) ao invés de substituir os nove tributos originalmente previstos na PEC 110/2019.
No lugar desse único IBS, a proposta sugere a rigor dois tributos, um Federal e outro Estadual. O Federal seria a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) com propósito de substituir apenas PIS e Cofins.
Do outro, manteve um “IBS subnacional ou estadual”, para substituir apenas ICMS e ISS. A substituição do IPI, nessa configuração, caberia ainda a um outro imposto distinto, de natureza seletiva e finalidade extrafiscal (como coibir o consumo de determinados produtos e serviços, a exemplo de bebidas alcoólicas e cigarros).
Essa mudança permitiria a gestão independente dos recursos entre a União e os Estados, DF e Municípios. Facilitaria a aprovação pelo Congresso e evitando disputa de interesses. Para seus defensores desse modelo, o IVA dual seria ainda melhor compatível com as particularidades do federalismo brasileiro.
O desenho das alíquotas e a concessão de benefícios fiscais também seguem dividindo autoridades e especialistas. De um lado, há quem defenda um IVA de alíquota estritamente uniforme como solução já verificada em países com o imposto. De outro lado, é mencionado que países desenvolvidos também adotam com eficiência a diferenciação de alíquotas com base na essencialidade de bens e serviços.
Como funciona o IVA em outros países
Mais de 160 países adotam algum modelo de imposto sobre valor agregado, segundo dados da Tax Foundation de 2022. Obviamente que cada país tem suas próprias particularidades e forma de estado e governo que podem facilitar ou dificultar o consenso. À exceção dos Estados Unidos, onde cada estado tem o seu regime próprio de vendas e não há imposto federal de consumo, o IVA é consenso entre economias desenvolvidas e em desenvolvimento.
Uma das questões de maior discussão em todo mundo é do imposto sobre consumo. São muitos os modelos de alíquota, de repartição de competência para instituição de um IVA ou da média de impostos cobrados por um governo.
A complexidade é existente em todo mundo, sobretudo quando se fala em modelo de alíquota que pode ser uniforme ou combinada. Alguns países adotam uma alíquota padrão em coexistência com alíquotas reduzidas (zero ou mesmo isenção), como por exemplo a Suíça, Croácia, Egito, Eslovênia, Gana e Vietnã.
Outros países adotam o IVA com uma alíquota padrão, sem nenhuma previsão de alíquota reduzida, como Singapura (7%), Austrália (10%) e também países do Golfo Pérsico (5%). A opção pela alíquota uniforme é citada como modelo na justificativa da PEC 45/2019.
Quanto à competência para instituir (criar) o tributo, um bom exemplo a observar está na União Europeia, que tem um dos modelos mais evoluídos de aplicação do IVA, em que um conselho estabelece regras gerais aplicáveis a cada Estado-membro, que também podem fixar uma alíquota padrão em seu território, desde que não inferior a 15% e igual para produtos e serviços.
A discussão sobre as taxas médias praticadas em outros países não é pacífico. A média da alíquota IVA nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) gira em torno de 20%. A taxa média da União Europeia está em 21%. Há exemplos de aplicação funcional do IVA acima e abaixo. No Japão, por exemplo, o imposto é 10%. Na Hungria, 27%.
No Brasil, uma das primeiras sinalizações do governo, feita pelo secretário Bernard Appy, indica a possibilidade de ação de uma taxa de 25%. Mas utilizar modelos de outros países é uma tarefa muito complexada dada a diferença estrutural entre os regimes políticos, tributários e econômicos dos países pesquisados.
A reforma tributária está em discussão há muitos anos e, embora pareça está chegando a uma conclusão, acredita-se que ainda há muitos pontos a serem observados e trabalhados. Mas nunca se deve esquecer o objetivos principais para a reforma tributária: criar uma tributação justa de fácil compreensão e arrecadação.
Deixo uma reflexão que pouco se ouve nos debates da reforma: Como garantir que os recursos que a população paga será aplicada de forma eficiente e correta? Qual a preocupação dos governantes em reduzir as possibilidades de desvios de recursos?
Termino este post afirmando: tão importante quanto arrecadar, é controlar os gastos.
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Dr. Rafael da Silva Aires,
Advogado especialista em Direito Tributário
Membro da Comissão de Assuntos Tributários na OAB-DF
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